Muito se ouve falar que o patrimônio das empresas está intimamente ligado com o seu histórico de obras, os quais são materializados no acervo técnico da empresa, sua capacidade técnica operacional.
Após anos de existência e muitas obras as empresas conseguem atingir um patamar de expertise que lhes permitem participar de uma grande quantidade de processos licitatórios, os quais exigem dos interessados a demonstração de que possuem capacitação para a execução de determinada obra.
Os atestados de capacidade técnica são os documentos que comprovam que determinada empresa forneceu materiais, prestou determinado serviços ou executou determinada obra.
A Lei de licitações permite que os órgãos públicos exijam dois tipos de capacitação técnica: capacidade técnico profissional e capacidade técnico operacional. No primeiro caso é a demonstração de que determinada empresa possui profissionais com experiência anterior naquele objeto a ser licitado; já a capacidade técnico operacional diz respeito com a experiência que a empresa em si possui na execução de determinado objeto.
No atual cenário econômico e politico, diversas empresas de Engenharia acabaram sofrendo duros processos de recuperação judicial ou encontram-se em estado falimentar devido a escassez de recursos Governamentais, vendo-se obrigadas a encerrar as atividades ou optando por algumas das formas de reestruturação societária como a fusão, cisão ou incorporação.
Em optando a empresa a se reestruturar, como ficam seus atestados de capacidade técnico operacionais? Seria possível a transferência dessa capacidade técnico operacional? Ou simplesmente devemos desconsiderar todo o know-how adquirido após anos de muito trabalho?
Como a doutrina e o Poder Judiciário tem enfrentado tal situação?
A temática apresenta 03 posições distintas sobre o tema, sendo que este artigo irá justificar a adoção de uma delas, a mais adequada e recomendada aos gestores públicos.
1) A primeira posição busca justificar que a administração deve aceitar de forma indistinta qualquer forma de transferência da capacidade técnico-operacional que advenha de fusão, cisão e incorporação;
2) Por outro lado, a posição diametralmente oposta, argumenta que é impossível qualquer forma de transferência do acervo técnico como parte de uma reestruturação empresarial;
3) Por fim, a posição que acreditamos ser a mais adequada, mediadora das duas primeiras, que seria a mais ajustada a legislação e a realidade empresarial, a qual permite a transferência do acervo técnico, mas exige determinados elementos de ordem subjetiva.
Na terceira corrente, a qual adotamos, e recomendada aos órgãos Públicos, a reestruturação empresarial deve vir acompanhada da transferência de parte da “cultura organizacional da empresa”.
Utilizando a cisão parcial como exemplo, devem as empresas transferir, além do patrimônio intangível ( acervo técnico), parcelas do elemento subjetivo que fazem parte da cultura organizacional da empresa, como gerência administrativa, contábil e administração central.
A reestruturação deve ser um negócio jurídico devidamente estruturado – cisão parcial, devidamente registrada na Junta comercial.
A transferência da capacidade técnico-operacional deve ser seguida da transferência, ainda que temporária, de seus responsáveis técnicos.
Como a soma destes elementos, estaremos diante de uma efetiva transferência do acervo técnico, juntamente com parte da cultura empresarial, o que afasta a ideia de uma simples compra e venda de atestados.
Diante de uma situação concreta de inabilitação de uma empresa à qual realizamos acompanhamento de contrato, obtemos uma liminar para declarar válida a utilização do acervo técnico oriundo de cisão parcial de empresas.
No processo demonstramos liminarmente todos os elementos transcritos acima, possibilitando nosso cliente habilitar-se no certame e sagrar-se vencedor em uma obra de valor considerável.
No caso dos autos, a comissão da licitação promovida pela parte ré, destinada à contratação de empresa para prestação de serviços de manutenção dos pavimentos de determinados trechos de rodovias, indeferiu o pedido de habilitação da demandante, em razão da ausência de comprovação de sua capacidade técnico-operacional, tal como determinado no edital de abertura do Certame, em seu item 8.1.10, fl. 37, in verbs:8.1.10. Prova de Capacidade Técnica Operacional, através de atestado (s) expedido por pessoa jurídica de direito público ou privado, acompanhado (s) da (s) CAT (s) do profissional, devidamente registrado no CREA, que demonstrem que a licitante possui experiência na execução do serviço conforme tabela compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação. E assim procedeu porque não considerou, como documento hábil à referida comprovação, os atestados de capacidade apresentados pela requerente, nos quais constavam o nome de empresa diversa, qual seja, xxxxxxx, conforme se extrai das razões lançadas na ata de julgamento das fls. 79/81.Ocorre que, ao exame dos documentos aportados com a petição inicial, em especial das cópias do contrato social da autora e suas alterações (fls. 92 e seguintes), verifiquei que a empresa xxxxx integrou, durante determinado período de tempo (entre os anos de 2015 e 2017), o quadro societário da empresa demandante, integralizando o capital social por meio da transferência, ao patrimônio da licitante, de atestados de capacidade técnica (fl. 93), que, diante disso, foram incorporados ao acervo intangível da xxxxxx. Além disso, constatei que tanto o Diretor-presidente da empresa xxxxx à época, xxxxx, quanto o seu Diretor, xxxxx, hoje figuram como responsáveis técnicos da empresa xxxxxx (fls. 89/90), a evidenciar a efetiva transferência de recursos humanos entre as pessoas jurídicas, configurando, outrossim, genuína cisão parcial, cuja regularidade da reorganização societária goza de presunção advinda do arquivamento dos atos na Junta Comercial do Estado. Nessa perspectiva, tendo havido a transferência, entre as empresas, não só dos atestados de capacidade técnica, mas também de recursos humanos (estrutura pessoal), reputo viável o aproveitamento dos documentos que foram desconsiderados pela comissão de licitação, por ter havido efetiva transferência de capacidade técnica, e não mera cessão de documentos.(….) DEFIRO A LIMINAR reclamada na inicial, assegurando à Impetrante o direito a ver-se mantida no processo licitatório antes referido e participar, em igualdade de condições com as demais empresas habilitadas, da fase de julgamento e classificação das propostas de preço.A transferência de capacidade técnico operacional pode ser uma das formas de enfrentamento da crise, ou de capitalização das empresas que possuam um considerável acervo técnico, permitindo que empresas mais jovens possam utilizar-se da expertise daquelas mais experientes. Para maiores informações entrem em contato a E3 Licitações.