Ou ainda: Porque uma obra que demora o dobro do tempo planejado e custa o triplo do orçado não é sintoma de empreiteiras corruptas querendo superfaturar contratos, mas, sim, ingerência da Administração Pública.
Com todos os casos expostos na Lava-Jato e em outras operações anti-corrupção, aditivos contratuais tornaram-se quase sinônimos de corrupção e faturamento. Porém, na maioria dos casos, este é o único recurso ao qual as empresas que se dispõem a construir para o Estado podem recorrer para não falir no processo e conseguir entregar obras de qualidade, mesmo contando com um projeto falho e mal dimensionado.
Veja, a seguir, como a gestão de contratos e o acompanhamento de obras podem tornar este processo menos traumático e mais lucrativo, além de disciplinar a Administração Pública.
Contextualizando
Em toda relação contratual onde existem mutuas obrigações, cada parte tem uma obrigação distinta, regida por um acordo entre as partes, ou Contrato.
Num contrato de compra e venda o comprador tem a obrigação de entregar o objeto negociado – transferência do domínio, em perfeito estado de conservação, exatamente como acordado – enquanto o comprador, por sua vez, tem a obrigação de pagar o preço estipulado, exatamente da forma em que fora estabelecido entre as partes. De acordo com o Código Civil:
“Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.”
Não deveria ser diferente nos contratos da Administração Pública: os contratados deveriam entregar exatamente aquilo que estava previsto no edital e no contrato e, por sua vez, a administração pública deveria cumprir com os pagamentos, de acordo com o cronograma físico-financeiro estabelecido e confirmado pelas devidas medições.
Nos contratos regidos pelo direito privado permite-se aos contratados suspender a execução do que lhe cabe no contrato enquanto o contratante não adimplir (pagar) a sua parte. Também de acordo com o Código Civil:
“Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.”
Porém, quando se trata dos contratos administrativos (da Administração Pública), tal cláusula tem aplicação restrita. Assim, não é lícito ao particular, portanto, interromper a execução da obra ou do serviço contratado, ainda que a Administração permaneça sem adimplemento por um período de tempo. Com isso, rendem-se homenagens ao princípio da continuidade do serviço público, corolário da supremacia do interesse público.
Quando uma empresa participa de uma licitação, ela previamente estabelece um cronograma econômico-financeiro de acordo com o estabelecido no edital, e o preço ofertado tem reflexo direto sobre a produtividade da obra (custo da mão de obra, maquinário em razão do fator tempo). Os prazos de pagamento refletem o número de funcionários a serem contratados durante o prazo contratual, aluguel e disponibilidade de maquinários, pagamentos de garantias contratuais, etc.
Via de regra, os serviços executados por uma empresa durante um mês devem ser medidos em até 30 dias, e adimplidos/pagos em até 90 dias, totalizando 120 dias entre o término da execução dos serviços e o pagamento. Durante este período todos os encargos financeiros assumidos pela Contratada devem ser pagos: funcionários, impostos, fornecedores, etc.
Porém, a lei 8.666/93, dentro do princípio da supremacia do interesse público, permite ao Estado uma infinidade de prerrogativas que não existem no direito privado. As empresas que licitam com o governo já conhecem, previamente, estas prerrogativas e costumam se precaver, em seus preços e cronograma ofertados.
No entanto, atualmente, temos um cenário em que os Órgãos Públicos estão se utilizando, abusivamente, de TODAS as prerrogativas para manterem suas obras em dia às custas das empresas.
A Situação Atual
Hoje a situação do setor de construção civil está quase insustentável. As empresas privadas é que estão bancando as obras públicas, já que os pagamentos são efetuados sempre com atrasos significativos, quando o são.
A economia financeira do Estado na elaboração de um projeto básico incompleto acaba por transformar uma obra de 10 milhões em três vezes isto, posto que a ausência de detalhamento faz com que o projeto se altere inúmeras vezes, devido à fragilidade de elementos no projeto licitado.
Popularmente, quando se fala em aditivos, grande parte da população entende que há um desvio de comportamento e, provavelmente, algum ato ilegal, quando na maioria das vezes é apenas a única solução viável para corrigir os reiterados erros da Administração Pública.
Dentro da sistemática atual, o Governo licita uma obra com um cronograma físico-financeiro definido, com prazo e metas estabelecidas para as empresas e, caso a empresa descumpra, terá sob si pesadas multas e penalidades.
Por sua vez, a necessidade de alteração de prazos contratuais passa única e exclusivamente pela necessidade de readequação de projetos, ausência de licenças ambientais e falta de estudos prévios do objeto licitado. Desta forma, uma obra com valor estimado em “x” milhões, com prazo de execução de 12 meses, acaba custando bem mais do que o valor original e levando 3 anos para sua conclusão.
Tomamos por exemplos as obras do Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (DNIT), na duplicação da BR 116.
Em média as empresas possuíam um prazo de 720 dias para execução das obras, em cada um dos 9 lotes. Para chegar uma proposta financeira as contratadas tomaram por base o prazo de execução contratual – de acordo com o cronograma físico-financeiro do edital assim são calculados, os valores gastos com mão de obra em 720 dias, aluguel de equipamento, depreciação de materiais/equipamentos da empresa, custo financeiro, etc.
Ocorre que, em nenhum dos lotes contratados, este prazo foi cumprido. Em todos, os prazos precisaram ser alterados por decorrência lógica da contratação baseada em um projeto básico incompleto. O custo de um engenheiro, que deveria receber 24 salários, já saltou para 40 salários e segue crescendo uma vez que, atualmente, as obras estão com 600 dias de atraso.
Como as empresas investiram pesado nestes contratos acabam arcando com todos os custos extras, os quais somente podem ser imputados ao Administrador Público.
Nota-se uma crescente elevação nos custos das obras públicas, sem que seja feita a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, e o reflexo está sendo visto na inadimplência das empresas, no crescimento dos processos trabalhistas, execuções fiscais e pedidos de recuperação judicial, que estão fazendo ruir o Setor de Construções no Brasil.
Onde entra a Gestão de Contratos e o Acompanhamento de Obras
As empresas raramente possuem uma consultoria especializada no acompanhamento das obras, e também, dificilmente, possuem um diário de obras que reflita a realidade. Os aditivos, quando concedidos, são impostos pelo gestor público, repassando ou dividindo, injustamente, a culpa pelos atrasos contratuais.
Com um meticuloso acompanhamento contratual, as empresas que possuem uma gestão especializada em seus contratos podem minimizar suas perdas e, em alguns casos, potencializar seus lucros, já que usualmente a falta de comprometimento do administrador público pode e deve ser confrontada pela equipe de acompanhamento.
Hoje as empresas são notificadas para dar inicio as obras quando sequer possuem licença ambiental, de responsabilidade da administração pública. Somente com uma modificação na cultura de gerenciamento de obras as empresas poderão restringir as exigências indevidas da administração, forçando o gestor público a manter um contrato equilibrado financeiramente durante toda sua execução.
A Gestão de Contratos e o Acompanhamento de Obras disciplinam e fiscalizam a relação entra Contratada e Poder Público, coibindo abusos, garantindo direitos e a execução adequada com o melhor uso do dinheiro público. No panorama atual este trabalho, desenvolvido pela E3 Licitações, mais que diferencial tornou-se um fator de sobrevivência para as empresas.